quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Projeto "Components" - entrevista com Elvira Souza Lima


Projeto "Components" - Café da manhã com Elvira Souza Lima / Frühstück mit Elvira Souza Lima

por Simone Naumann (Munique, Alemanha)



Bom Dia São Paulo! Na deliciosa mesa de café da manhã abacaxi maduro e pedaços de mamão de dar água na boca, o  cheiro de grãos de café brasileiro moído na hora no ar e com a gente, a inteligente e autêntica Elvira. Nascida em São Paulo, ela viveu e trabalhou em diferentes países. De volta ao Brasil,  continua  a se dedicar à educação. Ela está convencida de que toda criança tem o direito de aprender, de que toda criança é capaz de aprender quando dada a oportunidade e tem trabalhado e lutado por essas conquistas por muitos anos. Mas à pergunta de Simone: " como os adultos vão aprender novamente ? ", a resposta de Elvira, que você vai ler nesta interessante entrevista, é inteligente e simples. 

Simone Naumann - O que você está tomando no café da manhã?

Elvira Souza Lima - Café, pão integral e queijo branco. Mamão e abacaxi.

SN - Qual é o seu lugar favorito para o café da manhã na sua cidade?

ESL - Minha casa! Como viajo constantemente e encontro-me em hotéis diferentes o tempo todo, o melhor café da manhã para mim é quando estou sentada em frente a este enorme janela de vidro que eu tenho na minha sala de estar de onde eu posso ver a árvore de amora e minhas plantas e também ouvir os pássaros cantando. Eu preparo meu próprio café de grãos de café brasileiro.

SN - O que as pessoas gostam mais da sua cidade e o que você gosta mais?

ESL - São Paulo é um lugar para trabalhar, como as pessoas no Brasil costumam dizer. Eu acho que, para todas as classes sociais, viver em São Paulo significa oportunidade. Muitas pessoas estão aqui por razões de sobrevivência, para ganhar a vida. Mas também porque acreditam que seus filhos terão a oportunidade de estudar e ter uma vida melhor. Eu gosto da diversidade. Temos de  tudo nesta metrópole. As pessoas que vivem em São Paulo, a maioria delas, têm esperança de fazer algo melhor de suas vidas e isso torna esta cidade muito energética.



SN - No que você está trabalhando atualmente?

ESL - Eu trabalho com ideias, planejamento, projetos práticos e de pesquisa. Eu trabalho com projetos que envolvam pessoas de diferentes idades. Eu poderia dizer que eu estou trabalhando na troca de ideias para melhorar a nossa forma de olhar e cuidar de crianças e jovens, dentro e fora das escolas. Eu também trabalho com desenvolvimento humano na idade adulta.




SN - O que inspira você e o que você faz quando surge uma ideia?

ESL - A ideia de que todos, de todo o planeta, podem aprender me inspira. Os resultados muito positivos, neste campo difícil e geralmente algo impopular da educação, me inspira. As crianças, que vêm de diversas origens e diferentes contextos e estão lendo depois de apenas 3 meses de intervenção, me inspiram. Artistas e cientistas que lutam pela a possibilidade de fazer o que amam e acreditam  no que fazem contra todos os empecilhos, me inspiram. Meu próprios filhos me inspiram. Quando tenho uma ideia, eu primeiro sonho de que é possível realizá-la e imagino que já está acontecendo. O que eu faço envolve sempre o improvável, aquilo que é difícil de acontecer. Eu planejo o primeiro passo e depois tento colocá-lo em prática. Ideias são feitas realidade por pequenas ações concretas, caso contrário correm o risco de morrer antes que algo aconteça.

SN - Qual é o projeto de que você mais se orgulha?

ELS - Sem dúvida é Escrita para Todos ©. Eu estou orgulhosa do alcance que este projeto tomou, transformando a forma que os adultos veem a si mesmos e, portanto, contribuindo para desenvolver a capacidade de educar melhor as nossas crianças e nossos jovens. E, certamente, testemunhar a enorme capacidade que as crianças têm de aprender, apesar de suas condições de vida ou situações de vida.





SN - Se você tivesse seu próprio museu que artistas estariam na sua coleção?

ESL - Meu museu teria o piano de Nelson Freire  flutuando no espaço todo. Niemeyer,  os desenhos de suas ideias (arquitetura); poemas chineses originalmente escritos em seda; desenhos de Rodin e estudos de Da Vinci sobre o voo. Pensando bem, meu museu seria muito cheio de esboços e estudos que revelam os movimentos que a mente humana e a emoção humana desenvolvem para criar uma obra de arte.

SN - Quais são as plataformas de mídia social que você usa para o seu trabalho e como você as utiliza?

ESL - Eu uso o Moodle para criar comunidades de professores para discutir estratégias pedagógicas e ideias. Eles postam dificuldades que enfrentam em seus métodos de ensino e os participantes oferecem comentários e sugestões. É um modo muito dinâmico para tratar o ensino e a     aprendizagem. Eu uso Facebook. Eu publico um texto curto todos os dias, lidando com temas que me vêm à mente, informações, mas também comentários sobre questões teóricas, sobre o cérebro em funcionamento e um pouco da minha experiência em primeira mão das minhas pesquisas dentro das escolas. Eu escrevo constantemente sobre arte, as questões de arte, música, teatro e literatura. Eu uso e-mail e msn muito para manter o diálogo com tantas pessoas que eu lido no meu trabalho e nas minhas pesquisas. Eu tenho um blog e eu estou começando a planejar um canal no YouTube onde eu posso postar vídeos curtos de interesse para pessoas que trabalham com a infância e juventude.

SN -  A mídia social abriu portas para você?

ESL - Sim! Eu posso atingir um público muito mais numerosos do que o público que assiste minhas palestras e os que tem acesso aos meus livros.

SN - O que você está tentando alcançar com as mídias sociais e quem?

ESL - Difundir conhecimento, informação útil sobre o desenvolvimento humano e a ciência do cérebro para o público em geral. Também eu quero ser capaz de falar diretamente com os professores, já que eles são os adultos responsáveis ​​pela educação das novas gerações.

SN - O que fez você tomar participar do projeto "Components"?

ESL - É uma ideia nova. Para ter a possibilidade de interagir com mentes criativas, de diversas culturas, línguas e atividades; portanto, a possibilidade de aprender me fez querer participar.

SN - Como é diferente o projeto "Components" de outras plataformas online?

ESL - Ele lida com a criação,  a arte e as emoções e promove a interação entre as pessoas que dedicam suas vidas a algo não tão óbvio e que exige grande empenho: arte.

SN - Onde você acha que deve ser a próxima exposição do "Components"?

ESL - No Brasil, em uma área pública aberta e em uma comunidade de favela, simultaneamente.

SN - Quem você convidaria para café da manhã do projeto "Components"?

ESL - Dr. Udo Maack.

SN - O que você perguntaria a ele?

ESL - Sobre a percepção do espaço se formada, em parte, através do que é biologicamente humano e, em parte, através das experiências culturais individuais. Como você lida com a individualidade de cada pessoa durante o seu trabalho como  consultor? Há fatores comuns entre todas as pessoas com as quais você trabalha?




SN - Elvira, você criou um programa amplo e valioso para as crianças, que é composto de música, poemas, pinturas e tradições folclóricas. Você poderia nos ajudar, nós os adultos, cuja imaginação e criatividade são constantemente soterradas no cotidiano, sob cargas de trabalho, deveres e preocupações. O que podemos fazer, para encontrar um caminho de volta para nós mesmos e para o nosso lado criativo e nunca perdê-lo de novo?

ESL - Primeiro, você precisa encontrar a disciplina para encontrar tempo na vida de todos os dias para cuidar da sua sensibilidade. Dez minutos para começar é suficiente. Dez minutos para ouvir a música que você realmente gosta, de ler novamente duas ou três páginas de um romance que você aprecia, para assistir a uma cena de um filme que você gostou especialmente. Em outras palavras, 10 minutos para encontrar na sua memória algo agradável, que lhe dá prazer. Daí você pode tomar esses dez minutos para apresentar algo de novo para a sua memória. Uma nova peça de um artista que você já aprecia ou alguém novo. A chave é fazê-lo todos os dias, para se acostumar a ter uma ruptura na sua vida muito ocupada todos os dias. Uma vez que você tenha instalada a rotina de ter uma pausa, você cria memórias que vão ajudar a sustentá-la. Deste modo, ter uma pausa, uma pausa, todos os dias para alimentar a sua imaginação e para alimentar sua sensibilidade. Então você chega a um ponto de expandir um pouco. Os 10 minutos tornam-se 12 minutos tornam-se, 13 ... uma vez iniciado o processo, será muito difícil deixá-lo. É como nosso cérebro funciona. Uma hora por dia seria uma boa quantidade de tempo para desfrutar do que a humanidade criou de melhor. Você disse corretamente: `imaginação e criatividade foram soterrados", elas não estão mortas, apenas soterradas.

SN - Por que você escolheu a citação que você usou para o projeto "Components"?

ESL - A minha frase é a minha crença de que quando a humanidade inventa algo tão fundamental e poderoso como a escrita, ela pertence a todos. Ninguém inventa ou cria nada do nada. Milhares de anos de cultura e desenvolvimento estão por trás dos que hoje produzem ciência, tecnologia e arte. Portanto, a escrita é uma invenção que pertence a todos. Muitas crianças são estigmatizadas com a falsa crença de que elas não são capazes de aprender a escrever. No entanto, com o suporte de novos conhecimentos da ciência do cérebro (neurociência) agora sabemos que todos os seres humanos podem aprender. Isto é o que 'Escrita para Todos' © mostrou de forma tão vívida com crianças de diversos contextos sociais e culturais.

A entrevista in English / auf Deutsch


links: Elvira Souza Lima
        Simone Naumann
        Project Components


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Formação de professores - Neurociência

Cássia A. José Oliveira
Rosane Callegari 
Rosilene Moutinho Arriola 



PROFESSORAS AUTORAS :  O texto abaixo foi escrito pela Cassia, Rosane e Rosilene, participantes assíduas em nossos grupos de estudo.  É  importante escrever, criar memória do conhecimento pedagógico e das reflexões. Enfatizo sempre a necessidade de que o professor escreva tanto para si mesmo, fator de desenvolvimento profissional e pessoal, como para partilhar com os profissionais de educação.     Aproveitem!! 

Elvira Souza Lima


Ser pedagogo (a) é ter um grande desafio pela frente, é tratar do ensino para a formação das novas gerações! Quem trabalha com educação precisa estar constantemente atento à formação, pois ela é contínua ao longo da carreira profissional. O momento atual e todas as suas demandas clamam por profissionais de ensino que sejam competentes em sua prática educativa para que favoreçam efetivamente as aprendizagens dos educandos, tanto cognitivas, quanto sociais e afetivas. O olhar para a Educação, para as famílias e, principalmente, para os alunos, necessita, cada vez mais, de refinamento e de diversas óticas. A neurociência é uma dessas lentes fundamentais que lançamos mão em nossa prática pedagógica para torná-la mais clara. Conhecer e levar em consideração o desenvolvimento do cérebro é fundamental, pois a aprendizagem dos conhecimentos escolares acontece em função do desenvolvimento e funcionamento deste órgão.

Pesquisar e estudar sobre a neurociência, nos grupos de estudos, orientados pela Elvira de Souza Lima, tem nos ajudado a compreender como o cérebro humano funciona e, portanto, aprende, dando-nos uma possibilidade maior de alinhar a nossa docência aos processos mentais em cada fase do desenvolvimento, tornando a nossa ação mais eficiente. Como pano de fundo, estamos estudando a biologia e a sua relação com a aprendizagem, ou seja, o que é próprio do desenvolvimento da espécie e o que culturalmente pode ser ensinado atrelado a esse desenvolvimento.

O que é ensinado é cultural e tudo o que é cultural sofre perdas e ganhos, dependendo da nossa atuação. Nesse sentido, as nossas intervenções devem ser sistemáticas, com muitas reincidências para que a aprendizagem passe da memória de curto prazo para a memória de longa duração. Somente assim ela se solidifica e pode ser usada em diversas situações, num processo de relações e de transferências. É assim que os neurônios fazem sinapses, criam novas redes, tornando os conhecimentos significativos e aumentando a nossa capacidade de aprender.

Se o conhecimento não foi trabalhado no momento adequado ou não foi revisitado o suficiente não se formará a memória de longo prazo, parecendo até que os alunos nunca visitaram aquele conteúdo. Como mágica, eles desaparecem!

Na Educação Infantil, o foco de estudo tem sido o desenvolvimento das estruturas de pensamento e o quanto o trabalho com a socialização, com a função simbólica, com o movimento, com o espaço, com os sentidos, com a observação, a atenção, a memória, a imaginação, a criatividade, a geometria, a música e as artes são fundamentais.

Para as professoras de 1° e 2° Anos, os estudos dão continuidade aos aspectos anteriores, mas privilegiam reflexões sobre a escrita, a leitura e a Matemática, que são desdobramentos da função simbólica, pois envolvem a elaboração de sistemas simbólicos, ou seja, dar significado ao que antes não tinha.

Para a alfabetização e a sua consolidação é importante resgatar e ensinar padrões como as sílabas, aprofundando os estudos das dimensões da linguagem que envolvem não somente escrever corretamente a ortografia, mas escrever frases e textos com estrutura, dominando o significado das palavras, ampliando o acervo de vocabulário, com conhecimento da origem das palavras e com prosódia, que é a dimensão mais complexa que dá vida, dá cor, dá imagem à escrita.

Quando os professores ampliam seus conhecimentos sobre a neurociência conseguem contribuir melhor para a elaboração de uma didática alinhada com os processos mentais em cada período de desenvolvimento. Na verdade, só há aprendizagem dos conhecimentos formais pelo ser humano se houver ensino planejado e intervenção a cada atividade realizada.

Uma grande contribuição que a neurociência trouxe para a educação é esclarecer que só haverá aprendizado se houver ensino do conhecimento formal por parte do educador e estudo e esforço por parte do educando.

Cássia A. José Oliveira – professora do 1° Ano
Rosane Callegari – professora do Jardim I
Rosilene Moutinho Arriola – professora do 2° Ano

do site de Elvira Souza Lima



Michel Serres e a geração mutante




Liberation - Você afirma que nasceu um "novo ser humano". Quem é ele?

Michel Serres - Eu o batizo de Pequeno Polegar, por sua capacidade de enviar mensagens SMS com o polegar. É o aluno e o estudante universitário de hoje, que vivem um tsunami de tanto que o mundo muda ao seu redor. Estamos vivendo um período de enorme inflexão  comparável ao final do Império Romano e ao Renascimento.

As sociedades ocidentais sofreram duas grandes revoluções: a transição do oral para o escrito, em seguida, do escrito para o imprenso. A terceira é a transição do impresso para as novas tecnologias, transição igualmente importante. Cada uma dessas revoluções foi acompanhada por mutações políticas e sociais: durante a transição do oral para a escrita foi inventada a pedagogia , por exemplo. Estes são também tempos de crise como a que vivemos hoje. Finanças, política, escola, igreja ... me aponte um domínio que não esteja em crise! Não há nenhum. E tudo repousa sobre a cabeça do Pequeno Polegar  , pois as instituições, completamente ultrapassadas, já não acompanham as mudanças. Ele tem de se adaptar a um ritmo frenético, muito mais rápido do que seus pais e avós. É uma metamorfose!

Pequeno Polegar, a geração mutante - entrevista com Michel Serres (aqui)

do site Malazartes.net

Sobre o sentido do tempo

Elvira Souza Lima

Interessante artigo no Le Monde Science fala sobre a percepção do tempo. Comenta sobre como a percepção que temos do tempo varia conforme nosso estado emocional. Ou seja, as emoções modulam a percepção do tempo em nosso cérebro. O assunto é complexo, as informações sobre ele importantes para nossa vida de modo geral. Os franceses falam da percepção do tempo como o sexto sentido: seríamos aparelhados para esta percepção como o somos para o funcionamento dos outros sentidos. Com certeza, uma das obras máximas da literatura francesa já tratava deste assunto, antes mesmo do grande desenvolvimento da ciência do cérebro. Proust, com Em busca do tempo perdido, nos brinda com uma análise profunda sobre a questão do tempo na vida humana. Claramente há divergências entre o tempo "real" medido pelo relógio e calendário e como percebemos e sentimos o tempo. Encontra-se aí um dos dilemas da vida contemporânea, a aceleração nas ações humanas encontra um paralelo interno na percepção do tempo? Como ficam nossas emoções se pressionadas pelo tempo? São algumas das questões atualmente pesquisadas pela neurociência. E sobre a qual muitos escritores têm o que dizer. Brecht, Proust, Machado, Clarice Lispector...